O cinema de Denys Arcand
Por João Câmara
O
ano de 1986 representa um marco para o cinema canadense. Foi o ano em que o
renomado diretor Denys Arcand lançou o seu primeiro longa-metragem aclamado
pela crítica internacional. O Declínio do
Império Americano (1986) fez com que o diretor canadense passasse do
anonimato ao reconhecimento internacional praticamente do dia para noite. Sua
produção era essencialmente independente, caracterizada pelo grande número de
curtas-metragens e documentários. Todavia, a partir de 1986 o panorama de sua
carreira toma um novo rumo, e após duas décadas alternando entre grande
sucessos e períodos inativos, em 2004 o diretor foi finalmente premiado com o
Oscar de melhor filme estrangeiro, por seu longa-metragem As Invasões Bárbaras.
É impossível dissociar As Invasões Bárbaras (2003) do filme O Declínio do Império Americano (1986), pois ainda que sejam
separados por um período de dezessete anos, constituem duas partes de uma mesma
narrativa. Os dois filmes abordam um tema muito recorrente em toda sua
produção, a sociedade capitalista, e conseqüentemente a crítica de Arcand às
relações geradas por esse modo de produção. Essas duas produções de destaque
internacional, nesse sentido, não destoam do cinema de Arcand pré 1986. Entre
sua longa lista de documentários, o mais notório deles é We work in Cotton (1970), onde o diretor retrata a
precária situação dos trabalhadores da indústria têxtil de Quebec, no Canadá.
O filme As
Invasões Bárbaras retrata a crise de uma sociedade movida pelo capital. O
diretor canadense tem como intenção principal analisar e criticar um sistema
econômico através das relações humanas. Nesse aspecto, ele se diferencia da
abordagem apocalíptica e sensacionalista de muitos filmes do seu vizinho
Estados Unidos da América. A queda de um império ou a crise de um modo de
produção são representados pela crise do homem, dos sujeitos que fazem parte de
laços fragilizados e distorcidos pela vida ditada por motivações
econômicas. A narrativa gira em torno de
um homem que diagnosticado com uma doença terminal enfrenta uma crise
existencial e identitária. Arcand utiliza de maneira brilhante o então enredo
simples e até recorrente no cinema para construir uma crítica a sociedade
contemporânea onde o dinheiro pode comprar tudo, menos a vida.
É possível fazer analogia entre as duas produções de
Arcand e a história do fim do império romano. A escolha dos títulos das obras
do diretor canadense é proposital. Tanto
no mundo antigo ocidental como no império americano contemporâneo, o inimigo
externo aparece como uma possível justificativa para o declínio da sociedade. A
produção de 2003 integra uma conjuntura social e política pós 11 de setembro de
2001, momento em que a grande potência do mundo globalizado e contemporâneo
sofreu um ataque externo e tem sua hegemonia enfraquecida. Denys Arcand com
certeza não apontaria as supostas “invasões bárbaras” de 2001 como sendo o
fator gerador de crise, muito pelo contrário, desde 1986 o diretor atenta para
esse declínio abordando as relações internas dessa sociedade movida pelo
dinheiro. As invasões bárbaras de
Denys Arcand finalizam uma elaborada crítica do diretor canadense ao modo de
produção norte americano iniciada em 1986 com o lançamento de O Declínio do Império Americano.
João
Câmara é graduando em História na UFRGS
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